Liderança militar

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Liderança é considerada a habilidade de motivar, influenciar, inspirar e comandar um grupo de pessoas a fim de atingir objetivos.

O tema liderança integra uma área de pesquisa que tem despertado grande interesse no mundo atual. Trata-se de assunto complexo, haja vista envolver variáveis de igual complexidade dentro da psicologia social. Os meios acadêmicos, empresariais e militares debruçam-se, cada vez mais, no estudo da fenomenologia da liderança.

Não existe ainda um consenso quanto à natureza do processo da liderança. Trata-se de um fenômeno amplo que engloba diversas teorias que tentam explicá-lo. Segundo o Dicionário Aurélio da lingua portuguesa, liderança é uma forma de dominação baseada no prestígio pessoal, a qual é aceita pelos dirigidos; é a capacidade de liderar, espírito de chefia; é a função de líder.
Por vezes, o termo liderança pode ser confundido com gerência. Entretanto, estudiosos do assunto frisam que a liderança não é sinônimo de gerência, administração ou chefia.

Independentemente do conceito adotado, quatro fatores sempre estarão presentes quando da manifestação desse fenômeno:

- uma situação;

- o líder;

- os liderados; e

- a interação entre líder e liderados.

(1) A situação é criada pelo somatório de elementos de origens interna e externa que venham a exercer influência sobre o grupo (líder e liderados), a sociedade ou a instituição. Tais elementos surgirão de ações ou reações ocorridas nos diversos campos do poder (político, econômico, psicossocial, militar e científico-tecnológico), afetando a capacidade e a motivação do grupo para o cumprimento de suas tarefas. (2) O líder atua como um elemento que influencia o comportamento dos liderados, independentemente de suas vontades. (3) Os liderados são o grupo sobre o qual o líder irá exercer a sua influência e com o qual irá interagir. O conhecimento dos liderados, por parte do líder, é fator primordial para o exercício da liderança e depende do entendimento claro da natureza humana, de suas necessidades, emoções e motivações. (4) A interação é vital para que ocorra a liderança de um indivíduo em relação a um grupo. É o processo pelo qual informações, ideias, pensamentos, sentimentos e emoções tramitam entre os membros do grupo, permitindo a inter- -relação entre eles.

Teorias da liderança

A partir do século XX, muitos sociólogos, psicólogos, filósofos, militares e outros profissionais passaram a estudar com maior interesse o fenômeno da liderança. Desses estudos, e a partir de várias teorias sobre o assunto, resultaram quatro correntes de pensamento que se fizeram mais conhecidas: a corrente centrada na figura do líder; a corrente centrada nos seguidores; a corrente centrada na situação; e a corrente integradora. Todas essas teorias concordam com a existência dos quatro fatores da liderança vistos no parágrafo anterior, mas focam-nos de modo diferente. Concordam, também, que o destaque alcançado pelo líder dentro do grupo lhe confere e assegura o respeito e a credibilidade perante os liderados. Entretanto, tais teorias divergem quanto às origens desse destaque.

Corrente centrada na figura do líder

Essa corrente foca principalmente o que o líder é e o que ele faz. Consideram os seguidores dessa linha de pensamento que a liderança é qualidade intrínseca do líder, praticamente desprezando as influências do meio. Portanto, interpretam o destaque do líder como resultante de suas qualidades ou de suas ações frente aos demais integrantes do grupo. A liderança seria uma característica ou uma qualidade dos mais bem dotados, não podendo ser aprendida ou considerada fruto de ações daqueles que se proponham a aprendê-la. Essa tese pode ser contestada observando-se exemplos de deposição ou queda de popularidade de lideranças em face de situações variadas. Algumas teorias podem ser elencadas como seguidoras dessa corrente, a saber:

  • (1) Teoria Inatista (propriamente dita): defende que o líder é um indivíduo predestinado ou abençoado pela “Providência Divina” ou pelo destino para exercer a liderança de grupos e povos.
  • (2) Teoria do Grande Homem: é uma teoria muito influenciada por uma visão messiânica e carismática da liderança. O líder é visto como um herói que surge em um dado momento para definir ou transformar o curso dos acontecimentos.
  • (3) Teoria de Traços: nessa visão, defende-se que a posse de certos traços de caráter e de personalidade permite àqueles que os possuam o acesso ao poder ou ainda determina a disposição do indivíduo para esse mister.
  • (4) Teoria dos Tipos ou Estilos de Liderança: descreve o fato de que diferentes estilos de liderança (autocrático, participativo e laissez-faire) suscitam diferentes comportamentos dos subordinados e propõe, como mais importante, o estilo participativo.

Corrente centrada nos seguidores

Essa corrente nega que o destaque do líder se deva às suas qualidades superiores, e atesta que ele é produto do grupo. Com seus argumentos, procura caracterizar o líder emergente, isto é, aquele que desponta devido ao meio social. O profissional seria, então, levado àquela situação devido às contingências vividas pelo grupo ou às suas crenças sobre como deve ser um líder e não em virtude de suas competências superiores. A aceitação do líder emergente pelo grupo deve-se ao fato de ele representar e sintetizar, em um determinado momento, o ideal dos integrantes daquela coletividade. Os adeptos dessa corrente não explicam com clareza por que motivo apenas algumas pessoas adquirem prestígio e ascendem à liderança dos grupos, enquanto outras, embora o desejem e se empenhem, não o conseguem. Destaca-se, nessa corrente, a Teoria de Atribuição de Liderança, segundo a qual a liderança é atribuída pelo grupo àquele que demonstrar maior capacidade de solucionar eficazmente os problemas enfrentados por todos. . Já a Teoria Sócio-Histórica propõe o processo grupal como um processo histórico de formação de vínculos e de mentalidades, no qual os indivíduos mais experientes orientam os menos experientes nas lides próprias do grupo ou da instituição. É dentre os diversos indivíduos experientes que emerge uma liderança ou, por outro lado, é atribuída, pelo grupo, a liderança a um deles.

Corrente centrada na situação

Demonstrada a incapacidade das teorias das correntes anteriores para explicar integralmente o fenômeno da liderança, pesquisadores passaram a analisar a situação de liderança, isto é, a relação entre o líder e os liderados. Essa corrente trouxe um grande avanço para o entendimento do fenômeno, pois relativizou a situação do líder. A liderança passou a ser dependente da situação, o que levou à conclusão de que não basta ser um líder ou fazer algo para se tornar um líder, independentemente do lugar ou do tempo.

Corrente integradora

Essa corrente diferencia-se sutilmente das anteriores por não atribuir o surgimento da liderança a qualquer fatalidade, seja oriunda de ocorrências fortuitas da dinâmica grupal, seja por coincidências ligadas às características especiais do líder. Os seus adeptos consideram que os quatro fatores principais da liderança formam sistemas com múltiplas possibilidades de interação entre seus elementos constitutivos, devido às características dos grupos, às modificações da situação e às variações na interação entre o líder e os liderados. A corrente integradora aceita aspectos das correntes anteriores, levando em consideração tanto os fatores ligados à situação, quanto os componentes de caráter pessoal do líder e dos liderados. Demonstra, também, que a liderança surge por intermédio do tipo e da qualidade das relações funcionais que se estabelecem dentro do grupo, e que as competências evidenciadas por um indivíduo não têm, por si só, o poder de transformá-lo em líder. Argumenta que o prestígio do líder é consequência de sua participação ativa nos trabalhos ou nas postulações de determinado grupo social, aliada à demonstração de sua capacidade profissional e de suas características pessoais. Acreditam os defensores dessa corrente que, para liderar, o indivíduo precisa estar integrado ao grupo, participando de seus ideais e da preservação dos seus valores, bem como ciente da situação maior em que o grupo se insere. Essa corrente aponta para a importância da relação entre os diversos fatores que interferem na vida de um grupo e de como eles cooperam para o estabelecimento e a boa manutenção da liderança de determinado indivíduo. Abarca, também, outros estudos que assinalaram fatores externos ao grupo que podem influenciar no estabelecimento da liderança, em conformidade com a teoria sistêmica. Nessa corrente, destacam-se várias teorias que se firmaram ao longo do século XX, principalmente nas três primeiras décadas que se seguiram ao término da Segunda Guerra Mundial. Dentre essas teorias, a Teoria do Campo Social propugna a liderança como fruto da interação de quatro fatores – situação, líder, liderados e interação – e responde, de modo mais efetivo, ao pensamento militar brasileiro. Essa teoria foi desenvolvida por Kurt Lewin (1890-1947), psicólogo alemão, que, buscando explicações sobre a motivação do comportamento, elaborou, na década de 1930, a Teoria de Campo Psicológico, com base nos conhecimentos desenvolvidos pela Psicologia da Gestalt. Ele propôs que o comportamento humano é o resultado da totalidade dos fatores coexistentes, sejam do indivíduo (história de vida, características pessoais, expectativas e outros), sejam do ambiente, desde que internalizados pelo indivíduo. Para Lewin, a inter-relação entre todos estes fatores conforma um campo dinâmico, cujas partes são interdependentes e resultam em um comportamento expresso. Transportando essa teoria para os estudos que realizava com grupos, ele desenvolveu a Teoria do Campo Social, em que o grupo e o ambiente formam um mesmo todo, sendo explicada sua conduta ou seus resultados pela inter-relação dinâmica entre suas partes, internas e do ambiente. Para que um grupo atinja determinado objetivo é necessário, portanto, que a resultante dessas forças, que partem do líder, dos liderados, da interação entre eles e da situação, aponte para esta direção. i. A corrente integradora procura articular as proposições das correntes norte-americana e francesa, destacando a competência como a combinação de conhecimentos, habilidades e atitudes expressos pelo desempenho profissional em contextos organizacionais.

Formas de Liderança

Pode-se afirmar que a liderança é exercida basicamente de duas formas: a direta e a indireta.

Liderança direta

A liderança direta, como o próprio nome indica, ocorre em situações nas quais o líder influencia diretamente os liderados, falando a eles com frequência e fornecendo exemplos pessoais daquilo que prega. O líder, nesse caso, estará na linha de frente, interagindo frequentemente com o grupo. Por intermédio da liderança direta, laços de confiança sólidos e duradouros são estabelecidos com os indivíduos, uma vez que o líder pode satisfazer, em melhores condições, às necessidades de interação com os seus liderados. Na antiguidade, os comandantes de grandes exércitos criavam laços de liderança com seus comandados, principalmente, por meio de exemplos de coragem, demonstrados nas batalhas travadas contra inimigos ferozes. Nelas, eles participavam dos combates correndo os mesmos perigos que os liderados. Esses homens, sem dúvida, exerciam a liderança de forma direta, embora comandassem dezenas de milhares de soldados. Nos dias atuais, normalmente exercem a liderança direta aqueles comandantes que têm oportunidade de interagir diariamente com os subordinados, observando e sendo observados de perto. Na liderança direta, o líder atua diretamente sobre o grupo quando da execução daquilo que foi planejado nos níveis superiores. Por exemplo, o capitão, comandante de uma companhia, conduz pessoalmente seus subordinados nos exercícios de adestramento para o combate, executando as ordens do comandante do batalhão. Nesse nível, o líder estará sempre junto aos seus liderados, fornecendo bons exemplos pessoais. Por essa proximidade, o líder deverá estar atento aos detalhes, uma vez que as falhas ou erros, porventura cometidos, serão identificados com facilidade pelo grupo

Liderança indireta

Na liderança indireta, o líder exerce a sua influência atuando por intermédio de outros líderes a ele subordinados. Nesse caso, para que consiga influenciar os liderados nos escalões subordinados, é fundamental que se estabeleça uma cadeia de lideranças que atinja todos os indivíduos do grupo. Em outras palavras, é preciso que os líderes nos níveis intermediários aceitem as ideias daquele que se encontra no topo da pirâmide e as transmitam aos respectivos liderados como se fossem suas, evitando quaisquer distorções de entendimento da mensagem. Em grandes grupos humanos ou em organizações complexas, isso tenderá a não acontecer e, por esse motivo, o líder de maior nível deverá empenhar-se para exercer, também, a liderança direta, buscando contato mais aproximado com todos os liderados, inclusive os dos escalões mais baixos. Atualmente, os modernos meios de comunicação de massa possibilitam aos líderes, em muitas situações, falar diretamente a todos os liderados e ser visto por todos eles. Aqueles que se enclausuram em seus gabinetes, que não dialogam com o grupo, que não explicam as suas ideias e que não procuram convencer as pessoas estarão em pouco tempo isolados e a confiança que possam ter obtido de seus liderados tenderá a desaparecer. Não se pode esquecer que os comandantes que devem liderar nos níveis mais elevados precisam exercer, também, a liderança direta em relação aos colaboradores mais próximos. Esses indivíduos que observam o líder mais de perto identificarão suas virtudes e fraquezas e as divulgarão para os mais afastados. Ninguém poderá manter-se em uma redoma à prova de observação e, por isso, todos aqueles que estiverem em função de chefia devem adotar procedimentos adequados, que não solapem a credibilidade que precisam ter para liderar. Nesses níveis elevados, o chefe deve também buscar oportunidades de, ainda que esporadicamente, exercer a liderança direta sobre todos os subordinados. Nesse caso, ações como visitas, inspeções e palestras, dentre outras, são formas de o líder de níveis mais elevados buscar o contato direto com todos os seus subordinados ou, pelo menos, parte significativa desses.

Conceito de liderança militar

Por tudo o que foi exposto, percebe-se que a liderança militar não é algo que surge de uma hora para a outra, mas é construída com o passar do tempo, é fruto do relacionamento interpessoal estabelecido no cumprimento das missões militares. Sintetizando, é possível afirmar que:

A liderança militar consiste em um processo de influência interpessoal do líder militar sobre seus liderados, na medida em que implica o estabelecimento de vínculos afetivos entre os indivíduos, de modo a favorecer o logro dos objetivos da organização militar em uma dada situação.

Liderança Militar.png

Aspectos básicos

A liderança militar estabelecer-se-á apoiada basicamente em três pilares:

- proficiência profissional;

- senso moral e traços de personalidade característicos de um líder; e

- atitudes adequadas.

Assim, observa-se o que o líder deve saber, ser e fazer, além de interagir com o grupo e com a situação. São os fatores que criam e sustentam a credibilidade do líder militar.


A proficiência profissional indica capacidade, conhecimento, cultura. É condição sine qua non para o exercício da liderança, pois é a primeira qualidade que se observa e se exige de alguém que exerce uma função de comando. Abrange, além dos conhecimentos peculiares à profissão, a capacitação física para estar à frente dos trabalhos a serem realizados, a habilidade para se comunicar de modo eficaz com o grupo, o conhecimento de seus liderados e, sobretudo, o cuidado para interagir com pessoas, respeitando-as em suas deficiências e dificuldades. O senso moral diferencia os que usam o poder que determinado cargo lhes confere para fazer o bem e agir em prol da coletividade e da missão, dos que se aproveitam do cargo para auferir vantagens pessoais. Implica na incorporação à personalidade (caráter e temperamento) de importantes valores morais. O indivíduo deve possuir determinados traços de personalidade. A capacidade de liderança ocorre da junção harmoniosa de valores e de características desejáveis da personalidade (o ser) com os diversos conhecimentos necessários a um líder (o saber). A atitude adequada, fator preponderante para capacitá-lo ao exercício da liderança (o fazer), deve ser evidenciada na forma como o homem emprega os valores e as competências de sua personalidade com as ferramentas que seus conhecimentos lhe oferecem. A motivação para liderar será o elemento disparador que levará o líder a integrar os três pilares acima abordados. No entanto, ainda que determinado militar possua adequada capacidade de liderança e motivação para exercê-la, isso não assegura que ele venha a ser um bom líder. O processo de influência do líder sobre os liderados dependerá de como se relacionarão os quatro fatores da liderança (situação – líder –liderados –e interação entre líder e liderados) em determinado contexto. Como exemplo, é possível citar um comandante que se tornou um excelente líder em situação de combate e que não foi, necessariamente, um bom líder frente a uma organização militar de natureza administrativa. Dessa forma, considera-se inadequado o uso, muito comum, da expressão “desenvolvimento da liderança”. O que pode ser efetivamente desenvolvida é a “capacidade de liderança”, que não garante que o indivíduo se tornará um líder, porém contribuirá significativamente para que isso ocorra. Nos capítulos seguintes serão abordados aspectos que favorecem a construção de laços de liderança entre um comandante e seus subordinados, bem como serão explorados os três pilares básicos da liderança, por meio de um estudo ético dos valores e das competências desejáveis de serem internalizadas pelo comandante que deseja realmente ser um líder.

Liderança militar e comando

Liderança militar e comando

Da mesma maneira que, erroneamente, o termo liderança é muitas vezes usado no meio civil para se referir a gerência, o termo liderança, o termo liderança militar é empregado, inadequadamente, como sinônimo de comando na caserna. Entende-se como comando (chefia ou direção) o exercício profissional de um cargo militar, consubstanciado a autoridade legal desse cargo, a administração e a liderança podem ser consideradas ferramentas para a ação de comandar. Pode-se esboçar entre liderança e comando, caracterizando a liderança como um elemento informal, mas desejável, do comando. A liderança militar é, pois, a ferramenta que permite ao comandante mover homens e mulheres não apenas pela força de leis e regulamentos, mas por sua qualificação profissional e pelo seu empenho pessoal. Por intermédio da liderança militar, o comandante conduz o subordinado, realçando a vontade de buscar a vitória, não por uma simples questão de cumprimento de ordens, mas, sim, por considerá-la uma causa comum, justa e necessária. A liderança será um meio de obter a superação e a manutenção da motivação, a fim de se alcançar o envolvimento individual no esforço coletivo, na busca do cumprimento da missão.[1]

  1. MANUAL DE CAMPANHA C 20-10 - Liderança Militar. Estado-Maior do Exército. 2ª Ed, 2011.[1]